quarta-feira, 9 de abril de 2014

O artigo feminino deixou as reticências de lado...

Vale apena registrar este e-mail que circulou em 2005.

Esta é uma redação feita por uma aluna do curso de Letras, da UFPE -
Universidade Federal de Pernambuco - Recife, que obteve vitória em um
concurso interno promovido pelo professor titular da cadeira de Gramática
Portuguesa. (Publicada na coluna LIVRE PENSAR, de Ivaldo Gomes).




 "Era  a  terceira  vez que aquele substantivo e aquele artigo se encontravam  no  elevador. Um substantivo masculino, com um aspecto plural, com alguns anos bem vividos pelas preposições da vida. 

E o artigo era bem definido, feminino, singular: era  ainda novinha, mas com um maravilhoso predicado  nominal. Era ingênua, silábica, um pouco átona, até ao contrário dele: um sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanáticos por leituras e filmes ortográficos.  

O substantivo gostou dessa situação: os dois  sozinhos,  num  lugar  sem ninguém ver e ouvir. 

E sem perder essa oportunidade,  começou  a  se  insinuar, a perguntar, a conversar. O artigo feminino deixou as reticências de lado, e permitiu esse pequeno índice.


De  repente, o elevador pára, só com os dois lá dentro: ótimo, pensou o
substantivo, mais um bom motivo para provocar alguns sinônimos. 


Pouco tempo depois,  já  estavam  bem entre parênteses, quando o elevador recomeça a se movimentar:  só  que  em  vez de descer, sobe e pára justamente no andar do substantivo.  

Ele usou de toda a sua flexão verbal, e entrou com ela em seu aposto. Ligou o fonema, e ficaram alguns instantes em silêncio, ouvindo uma fonética  clássica, bem suave e gostosa. 

Prepararam uma sintaxe dupla para ele  e  um  hiato com gelo  para  ela. 

Ficaram conversando, sentados num vocativo, quando ele começou outra vez a se insinuar. Ela foi deixando, ele foi  usando  seu  forte  adjunto  adverbial,  e rapidamente  chegaram a um imperativo, todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo direto. 

Começaram a se aproximar, ela tremendo de vocabulário, e ele sentindo seu ditongo crescente: se abraçaram, numa pontuação tão minúscula, que  nem  um período simples passaria entre os dois. 

Estavam nessa ênclise quando ela confessou que ainda era vírgula ele não perdeu o ritmo e sugeriu uma ou outra soletrada em seu apóstrofo. 

É claro que ela se deixou levar por essas palavras, estava totalmente oxítona às vontades dele, e foram para o comum de dois gêneros. Ela totalmente voz passiva, ele voz ativa.

Entre  beijos, carícias, parônimos e substantivos, ele foi avançando cada
vez  mais:  ficaram  uns  minutos  nessa  próclise, e ele, com todo o seu
predicativo do objeto, ia tomando conta.







Estavam na posição de primeira e segunda pessoas do singular, ela era um
perfeito  agente da passiva, ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu
grande travessão forçando aquele hífen ainda singular. 


Nisso a porta abriu repentinamente. Era o verbo auxiliar do edifício. Ele tinha percebido tudo, e entrou dando conjunções e adjetivos nos dois, que se encolheram gramaticalmente, cheios de preposições, locuções e exclamativas. 

Mas ao ver aquele  corpo  jovem, numa acentuação tônica, ou melhor, subtônica, o verbo auxiliar  diminuiu  seus advérbios e declarou o seu particípio na história.

Os  dois  se olharam, e viram que isso era melhor do que uma metáfora por
todo o edifício. O verbo auxiliar se entusiasmou, e mostrou o seu adjunto
adnominal. 


Que loucura, minha gente. Aquilo não era nem comparativo: era um
superlativo absoluto. Foi se aproximando dos dois, com aquela coisa
maiúscula, com aquele predicativo do sujeito apontado para seus objetos.


Foi  chegando cada vez mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao
seu tritongo, propondo claramente uma mesóclise-a-trois.  


Só que as condições eram estas: enquanto abusava de um ditongo nasal, penetraria ao gerúndio  do  substantivo, e culminaria com um complemento verbal no artigo feminino.  

O substantivo, vendo que poderia se transformar num artigo indefinido depois dessa, pensando em seu infinitivo, resolveu colocar um ponto final na história: 

Agarrou o verbo auxiliar pelo seu conectivo, jogou-o pela janela e voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa, com o artigo feminino colocado em conjunção coordenativa conclusiva."



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